Quando abri meus olhos, cansado, o dia mal havia chegado.
Pela pequena janela que havia ao lado de minha cama, pude ver a luz
acinzentada de um dia que prometia mau tempo.
Por conta de tudo dentro de mim que me atormentava, me
parecia que o mau tempo era proposital , como algo que estivesse ali
para me provocar. Poderia ser também que os sentimentos que pulsavam
aqui dentro estivessem refletindo no céu, agora mais
claro, mas ainda nublado, que me pressionava lá fora.
Pressão. Não encontrei um melhor termo para expressar como
estava me sentindo. Tudo em volta me parecia normal, inofensivo. A
típica "bagunça organizada" denunciava o desleixo, com algumas roupas
fora do lugar e copos deixados em cima da bancada.
O ambiente permanecia o mesmo, era comum, familiar. Talvez o que o
deixava diferente e desconfortável fossem meus sentimentos, lembranças e
angústias.
Passei o dia pensando em todas as decepcionantes
conclusões as quais havia chegado tão recentemente e em como esse tipo
de pensamento fazia com que eu olhasse tudo ao meu redor com outros
olhos. Olhos mais maduros, mais sensatos, porém ainda decepcionados.
Depois de muito tempo, saí de casa com o intuito de esfriar a cabeça, tentar esquecer um pouco os problemas.
Andei por muito tempo, me pareceram horas. Andei até
chegar numa ponte não tão próxima da cidade. Chegando lá, parei e me
debrucei sobre o parapeito frio da ponte. Olhei para cima, o sol já se
punha e a cor do céu era estonteante. O alaranjado
forte em meio às nuvens era incrível. Todas as pessoas em volta andando
apressadas, concentradas em seus próprios interesses. Daquela maneira,
invisível, em meio a tantos estranhos, ainda trazendo comigo o peso que
havia acordado em minhas costas, me sentia
mais perdido e sozinho. Assistia ao misto de cores que se transformava
rapidamente no céu enquanto mais um dia se passava e me arrastava para
cada vez mais longe de minhas antigas esperanças, que agora passei a
ver, com meus novos olhos decepcionados, como
ilusões.
Tudo em volta mais uma vez me pressionando. A mudança de
cores rápida acima de meus ombros lenta e dolorosamente me mostrava que
mais um momento de escuridão estava a caminho. O desespero era tangível e
me encontrava desconsertado, sem saber o
que esperar ou fazer em relação a qualquer coisa.
Dentro de mim tudo estava remexido e, quase sem perceber, a
pressão suportada durante todo esse tempo foi liberada do jeito mais
primitivo: num grito.
E depois de toda a tensão, volto para casa na nova
esperança de que o tempo melhore as decepções e que eu me sinta
confortável novamente em meio a roupas jogadas e copos por lavar.
Fernanda Muniz é uma paulistana de dezessete anos que contribuiu pra o blog com sua interessante releitura do quadro "O Grito" do expressionista Edvard Munch. O legal é que esse texto foi originalmente feito para uma redação com o fim de descrever o personagem do quadro de Munch. Ficou muito bom não foi?
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